sábado, 28 de dezembro de 2019

O Leque e o Celular

O metrô deslizava pelas estações e a jovem deslizava os dedos no celular percorrendo aplicativos, mandando mensagens e respondendo outras. Aquilo já tinha se tornado um vício, ela não largava o celular, se escondia atrás do aparelho como um fumante viciado se esconde atrás de uma cortina de fumaça.
Era um fingimento, era uma representação.  Às vezes seus olhos percorriam o ambiente e quando percebia que alguém estava olhando, ela displicentemente digitava algo se fazendo de muito distraída e informal.
Conseguiu sentar e agora acessando a Netflix começou assistir um filme de época, uma estória que se passava em 1720, muito interessante, hábitos e costumes de 300 anos atrás.
Como tudo era diferente!, mas algo lhe chamou a atenção, aquilo veio como um flash, um relampejo, era como ela se visse a si própria, como se revivesse lembranças do fundo de sua alma, uma sensação estranha, uma sensação gostosa mas que mexe com o íntimo.
A moça do filme abria o leque e se escondia atrás, deixando só aparecer os olhos, e ela se via a si própria em uma cena que tinha vivenciado quando iria conhecer o futuro marido, um marido que o pai escolheu, um bom partido que lhe daria um brilhante futuro.
Aquilo doeu na alma, ela não aceitava isso, estava tentando encontrar alguém usando um aplicativo de namoro que tinha baixado no celular, e era independente e livre, nunca aceitaria alguém lhe impondo algo.  
Agora observava a moça do filme que com o leque na mão fazia vários gestos, cada qual com um significado.  Mas ela se identificava com tudo aquilo, dava a impressão que tinha vivido naquela época, mas isso era ridículo, ela não acreditava em outras vidas.
E a jovem em extrema reflexão, totalmente em alfa, se assustou quando se viu se abanado com o celular.

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